Um país que anda constantemente numa rotunda e que tarda em perceber qual a direcção que deve tomar para dela sair.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O Poder da Comunicação


A primeira página dos dois principais (com ainda alguma credibilidade) diários generalistas portugueses no dia de hoje davam destaque à suposta gaffe de Manuela Ferreira Leite. Na blogosfera, políticos do PS, PSD, BE (...) todos comentavam a substância da seguinte declaração pseudo-fascista de Manuela Ferreira Leite:

“Quando não se está em democracia é outra conversa, eu digo como é que é e faz-se”,“E até não sei se a certa altura não é bom haver seis meses sem democracia, mete-se tudo na ordem e depois então venha a democracia”. “Agora em democracia efectivamente não se pode hostilizar uma classe profissional para de seguida ter a opinião pública contra essa classe profissional e então depois entrar a reformar - porque nessa altura estão eles todos contra. Não é possível fazer uma reforma da justiça sem os juízes, fazer uma reforma da saúde sem os médicos”.

A ironia da declaração (que por isso não é gaffe nenhuma) e a crítica ao governo de Sócrates é evidente. Só um reparo a fazer, o uso da ironia pressupõe sempre a inteligência dos destinatários, o que, como se percebeu, seria sempre um exercício arriscado.

De bradar aos céus é a quase inexistência de notícias e comentários sobre um despacho clarificador da Sra. Ministra da Educação sobre o regime de faltas dos alunos (estes também em manifestação há dias atrás). Descubram as diferenças, e vejam a alteração produzida (ou seja o recúo, que José Sócrates nunca concede) no "Despacho Clarificador".

Artigo 22.º Efeitos das faltas - do regime jurídico em vigor)

1 — Verificada a existência de faltas dos alunos, a escola pode promover a aplicação da medida ou medidas correctivas previstas no artigo 26.º que se mostrem adequadas, considerando igualmente o que estiver contemplado no regulamento interno.

2 — Sempre que um aluno, independentemente da natureza das faltas, atinja um número total de faltas correspondente a três semanas no 1.º ciclo do ensino básico, ou ao triplo de tempos lectivos semanais, por disciplina, nos 2.º e 3.º ciclos no ensino básico, no ensino secundário e no ensino recorrente, ou, tratando -se, exclusivamente, de faltas injustificadas, duas semanas no 1.º ciclo do ensino básico ou o dobro de tempos lectivos semanais, por disciplina, nos restantes ciclos e níveis de ensino, deve realizar (...) uma prova de recuperação, na disciplina ou disciplinas em que ultrapassou aquele limite, competindo ao conselho pedagógico fixar os termos dessa realização.

3 — Quando o aluno não obtém aprovação na prova referida no número anterior, o conselho de turma pondera a justificação ou injustificação das faltas dadas, o período lectivo e o momento em que a realização da prova ocorreu e, sendo o caso, os resultados obtidos nas restantes disciplinas, podendo determinar:(...) c) A exclusão do aluno que se encontre fora da escolaridade obrigatória, a qual consiste na impossibilidade de esse aluno frequentar, até ao final do ano lectivo em curso, a disciplina ou disciplinas em relação às quais não obteve aprovação na referida prova.


Despacho do Minsitério da Educação:

Considerando que a adaptação dos regulamentos internos das escolas ao disposto no Estatuto do Aluno nem sempre respeitou o espírito da Lei, permitindo dúvidas nos alunos e nos pais acerca das consequências das faltas justificadas designadamente por doença ou outros motivos similares (...). Tendo em vista clarificar os termos de aplicação do disposto no Estatuto do Aluno, determino o seguinte:

1 – Das faltas justificadas, designadamente por doença, não pode decorrer a aplicação de qualquer medida disciplinar correctiva ou sancionatória.


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terça-feira, 18 de novembro de 2008

Bandeira Nazi no Parlamento da Madeira

Conforme bem sabemos, no passado dia 5 do corrente, o deputado José Manuel Coelho, do PND, exibiu a bandeira nazi em plena sessão do Parlamento na Madeira, atitude com a qual pretendia demonstrar o regime que se vive na Madeira, segundo ele, anterior ao 25 de Abril de 1974, e portanto um regime não democrático.

Apesar de sabermos que não tem havido alternância no poder no Governo Regional, que o Alberto João tem o feitio que tem, mas daí chegar-se a este exagero, de muito mau gosto, a que chegou este senhor, é de lamentar.

Foi um tristíssimo episódio, cujas implicações não foram, na minha opinião, tão severas quanto deviam. É que, apesar de haver liberdade de expressão, exibir um símbolo que significa na História Mundial, entre várias coisas horríveis, a morte de milhões de judeus no Holocausto, é muito grave, sendo que o silêncio que se seguiu por parte, nomeadamente do Presidente da República, não foi nada positivo. Exigia-se o repúdio veemente deste acto, que não foi irreflectido, mas premeditado, bem como, consequências políticas imediatas para este deputado.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Da série: História




A partir da década de cinquenta a CIA inicia contactos com a PIDE/DGS com o objectivo de prestarem colaboração mútua. A origem destes contactos deveu-se ao facto da CIA ter ficado impressionada com o trabalho "extraordinário" levado a cabo pela PIDE em Portugal. As duas polícias acordaram fundamentalmente na troca de informações sobre organizações comunistas, bem como proceder a operações de infiltrações no seio destas, matéria em que a PIDE tinha larga experiência em Portugal.

Mais tarde, a CIA chegou mesmo a convidar alguns elementos da PIDE para frequentarem nos EUA cursos de escuta telefónica, intercepção postal, criptografia, microfilmes, etc.
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terça-feira, 11 de novembro de 2008

Momento da Verdade


Acabo de assistir a um episódio do programa "Momento da Verdade", em que o concorrente tem que responder a perguntas sobre a sua vida pessoal para ir acumulando dinheiro.

A concorrente neste programa acabou de ganhar o prémio máximo - € 250,000.00. A última pergunta era: "Costuma sentir saudades da sua mãe?". A resposta foi não. A concorrente após validação da resposta pelo polígrafo e de ter percebido que tinha ganho o prémio entrou num estado de euforia incontrolável, saltou, gritou, abraçou-se à apresentadora do programa. Afinal tinha ganho € 250,000.00. Explicam-me, pois eu não vi o início do programa, que esta mulher tinha tido uma vida complicada. Mas eu, sinceramente, e sem falsos moralismos, continuei sem perceber. Esta mulher declara não ter saudades da sua mãe e em acto contínuo, após ganhar o prémio, parece ter atingido a felicidade máxima que qualquer ser humano pode alcançar.
Não percebo.
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domingo, 2 de novembro de 2008

Da série: Literatura



(Conversa entre o Sr. Toru Okada de meia idade (TO) e uma jovem de 15 anos (J) num jardim privativo e degradado nas traseiras de um prédio onde ambos são moradores e vizinhos).

J - Estás aí em baixo, não estás? Sei que estás aí. Então não me respondes?
TO - Sim, estou aqui.
J - Que diabo fazes aí?
TO - Penso.
J - Não percebo. Desde quando é que é necessário descer ao fundo de um poço para pensar? Imagino o desconforto que isso deve representar, já para não falar nas chatices!
TO - Em contrapartida, ajuda uma pessoa a concentrar-se. Está escuro, fresco, em silêncio.
J - Costuma dar-te muitas vezes para aí?
TO - Nada disso. É a primeira vez na vida. Quero dizer, a primeira vez que desço ao fundo de um poço.
J - E está tudo a correr bem? Estás a conseguir pensar, aí enfiado?
TO - Ainda não sei. Ainda estou a ver como é que a coisa funciona.
(...)
J - Escuta.
TO - O que é?
J - Se os homens vivessem eternamente, sem nunca desaparecerem deste mundo, sem nunca envelhecerem, nem perderem a saúde, acreditas que se davam ao trabalho de queimar os neurónios a pensar nisto e naquilo, como nós fazemos? Em filosofia, religião, psicologia, lógica, literatura. (...)

Quem é que se daria ao trabalho de pensar a sério sobre o facto de estar vivo, se soubesse que continuaria a viver tranquilamente para sempre? Ou então, mesmo que a necessidade de reflectir fosse real, o mais certo era as pessoas acabarem por dizer: "Tudo bem, ainda tenho muito tempo pela frente. Deixo isso para mais tarde."

As coisas não são assim. Temos obrigação de pensar neste instante, aqui e agora.

(excerto de "Crónica do Pássaro de Corda" de Haruki Murakami).


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